Manaus, 22 de outubro de 2024

Nesta segunda-feira (16), Manaus testemunhou uma marca histórica, já que o Rio Negro alcançou a preocupante medição de 13,59 metros, estabelecendo a pior seca já registrada na capital. Os dados provêm do porto da cidade, que monitora de perto o constante fluxo de subida e descida das águas.

O último registro semelhante aconteceu no dia 24 de outubro de 2010, quando o rio atingiu 13,63 metros. Naquela ocasião, a seca que se estabeleceu foi considerada a mais severa desde que as medições hidrológicas foram iniciadas no Rio Negro em 1902.

Agora, 13 anos depois, a marca foi superada oito dias antes da data anterior, e as águas continuam diminuindo, com uma média de declínio de cerca de 13 centímetros por dia, de acordo com informações do Porto de Manaus.

O Serviço Geológico do Brasil (CRPM) havia emitido um relatório no final de setembro deste ano, prevendo que o ápice da estiagem só ocorreria nesta segunda quinzena de outubro, agravando ainda mais a situação calamitosa da cidade.

Há uma semana, um vídeo do videomaker Thiago Oliver se tornou viral nas redes sociais, mostrando imagens aéreas que ilustravam a transformação na orla de Manaus. O vídeo, que recebeu mais de 50 mil curtidas, exibia uma comparação entre o Rio Negro em seu período de cheia e o atual estado de devastação devido à seca.

Manaus, juntamente com a maioria dos municípios do Amazonas, enfrenta uma severa crise ambiental. Além da seca recorde, que tem deixado comunidades isoladas, a cidade teve que fechar escolas nas áreas rurais e sofre prejuízos na navegação de embarcações e no escoamento de produtos do Polo Industrial.

A cidade também enfrenta uma “onda” de fumaça devido às queimadas na região metropolitana. Na última semana, a qualidade do ar em Manaus foi classificada como uma das piores do mundo.

Quase toda a orla da capital reflete o mesmo cenário. O rio “desapareceu”, dando lugar a bancos de areia e pequenos filetes de água. Até a principal atração turística, a Praia da Ponta Negra, teve que ser fechada, com uma cerca para impedir a passagem dos banhistas.

Até o famoso Encontro das Águas, um dos pontos turísticos mais conhecidos da cidade, não escapou do impacto da seca, alterando drasticamente a paisagem.

Em outras áreas da grande Manaus, uma visão de um “mar de lixo” e barcos encalhados substitui o majestoso Rio Negro que existia há um mês.

Para aqueles que dependem do rio para sua subsistência, a situação é desesperadora. O comerciante Erick Santos, de 29 anos, relatou os desafios que sua família enfrenta com a queda nas receitas e a presença de fumaça que afasta os clientes:

“Nossa renda diminuiu muito. Estamos vivendo com o mínimo do mínimo, apenas para pagar as contas de luz e água. Comemos o que sobra do restaurante. Sinceramente, não sei até quando vamos aguentar.”

Segundo ele, a incerteza sobre quando o rio voltará a subir deixa a família preocupada. A seca tem impactado diretamente no transporte de passageiros, como evidenciado por Manoel Alves, que trabalha em uma cooperativa de barqueiros na Marina do Davi:

“Está muito feio esse ano. A gente sabe que o rio vai baixar todo ano, mas esse ano a situação está muito difícil. Só vi algo semelhante em 2010, quando a seca foi muito intensa.”

A estiagem obrigou a cooperativa a transportar menos passageiros por viagem, o que afeta o valor do transporte e dificulta o sustento dos trabalhadores.

A situação já é desafiadora para a população ribeirinha, mas os especialistas alertam que o cenário tende a piorar antes de melhorar. A esperança reside na possibilidade de melhora no final de novembro e início de dezembro, quando o rio deve começar a subir novamente.

Desde o final de setembro, a Prefeitura de Manaus declarou situação de emergência na cidade, quando o Rio Negro estava medindo um pouco mais de 16 metros, três metros a mais do que a medição atual. Desde então, várias medidas foram tomadas para garantir que as zonas rurais e ribeirinhas da cidade não fiquem isoladas e desabastecidas, incluindo a abertura de poços artesianos e a distribuição de cestas básicas.

A combinação de fatores como o El Niño e a distribuição de calor no oceano Atlântico Norte tem contribuído para a seca severa no Amazonas, de acordo com especialistas. A população de Manaus, a “Paris dos Trópicos”, enfrenta uma crise climática que transformou a cidade, outrora majestosa, em um cenário de seca, queimadas e fumaça